Empresa produtora de Bebidas Espirituosas e Licores há mais de 20 anos, situada no vale do Zêzere entre as Serras da Estrela e a Serra da Gardunha, comercializa produtos de cariz tradicional e regional, tais como a Ginja Serra da Estrela, Zimbromel, Licor de Mirtilo, Amêndoa com Mel, Licor Serrano, entre outras.
Além das outras bebidas que produz, é dado destaque ao Gin, elaborado com o bom zimbro da região e já com duas versões lançadas.
A última é resultante da destilação de vários frutos como a cereja do Fundão, que lhe dá um início doce e um final surpreendente, onde se equilibra o frutado com o amargor característico do zimbro.
Um destes dias estivemos em Tortosendo à conversa com ARTUR ALEIXO, o responsável pelo nascimento desta empresa há mais de vinte anos.
Como é que começou esta empresa?
Esta empresa foi criada por mim, em 1980. Comecei como distribuidor de bebidas. Comprava o produto e vendia diretamente aos clientes. Tinha uma rede de clientela aqui na zona do Interior e já faturava bastante bem.
Entretanto, por volta de 1987, começaram a surgir em Portugal as grandes superfícies de distribuição e as pessoas começaram a ir fazer compras a um preço mais baixo do que o proposto pelo fornecedor habitual. Foi aí que vi que a minha empresa não tinha muito futuro, porque não tinha qualquer hipótese perante as condições e o poderio económico e de negócio dessas grandes superfícies. E foi assim que surgiu a ideia: se eu trabalho as outras marcas porque é que não faço as minhas próprias marcas? Ou seja, a ideia de fazer os meus produtos próprios. E foi desta maneira que nasceu a “Licor Serrano”, como uma empresa de produção.
E esse licor tem alguma tradição local?
De certo modo. Nós construímos o produto de raiz, sendo que a única tradição local é ir a produtos endógenos aqui da região – nomeadamente o vime, o leite, as natas, o zimbro, entre outros – para criar um produto novo. A mistura das natas e do leite, por exemplo, na altura servia para fazer queijo.Já eu fiz um licor. Depois fomos para outros produtos, para o chamado “mercado da noite”, ou seja, produtos para o grande consumo das discotecas e dos bares: as vodkas, os licores tropicais, amêndoa amarga, entre outros. Neste momento, reunindo todo o nosso portefólio, produzimos neste momento cerca de 70 produtos diferentes.
E porque nasceu o Gin?
O nosso gin tem uma história muito engraçada. Estamos numa região onde o elemento essencial do gin, que é o zimbro, existe em grande quantidade e qualidade aqui na Serra da Estrela. Falamos do melhor zimbro de Portugal e talvez do mundo. Uma planta rasteira, espontânea, que “vive lá em cima” a partir dos 1600 metros de altitude, um arbusto selvagem, mas que tem características muito boas. Ora, se estamos numa região onde o zimbro selvagem é dos melhores do mundo porque não fazer um gin com ele? E depois a esse zimbro associamos alguns “botânicos” como a canela, a casca de limão, pétalas de rosa e outros para construir esta bebida que está a ter um enorme sucesso.
E como se chama?
Por questões da comunicação, optámos por um nome em inglês. Queríamos fazer uma ligação entre o gin e a região, então, chamámos-lhe “Wild Snow Dog”, ou seja, o “Cão da Serra”. Selvagem, como se fosse um lobo da neve. Tal como o zimbro. Trata-se de um gin premium, porque passa por vários processos de destilação. Primeiro, destilamos o zimbro e depois destilamos os outros botânicos em separado para fazer o blending final. É um gin com uma complexidade elaborada. Recentemente, lançámos também o “Wild Snow Dog” de cereja do Fundão.
Então mas diga-me: o gin não é uma bebida que tem de ser feita só com zimbro?
A base é o zimbro, sim, mas depois podemos acrescentar vários botânicos. De momento, tenho projetos para fazer gin com 50 botânicos.
O gin antes era aquela bebida branca, transparente. Hoje temos gins maravilhosos, com várias cores. Como é que isto é possível?
A certa altura, o gin era “gin puro e duro”, feito só de zimbro e muito pouco mais. Era muito agreste, com uma acidez elevada, mas funcionava assim, sendo servido apenas gin com água tónica. Entretanto, os gostos e a evolução do mercado levaram as pessoas a querer uma bebida mais equilibrada e não tão ríspida, tão ácida, tão agreste. E como limar as “arestas” do zimbro? Com botânicos. Alguns frutados, outros mais herbais, como camomila ou chá preto, que juntamos para criar uma fórmula harmoniosa, fazendo desaparecer a agressividade do gin tradicional. O nosso gin de cereja, por exemplo, surge neste sentido também.
Além disso, nós temos o melhor zimbro de Portugal e temos também a melhor cereja, então associámos o zimbro da Serra da Estrela com a cereja da Serra da Gardunha. Falámos com a Câmara Municipal e fizemos um gin, combinando esses dois produtos endógenos.
E continua a ser bebido com a tradicional água tónica?
Sim, continua a ser bebido com água tónica, que também teve uma evolução bastante grande. Embora o nosso gin seja para ser bebido com águas tónicas mais neutras, existe a possibilidade de colocar águas tónicas com sabores. Mas, por exemplo, falando novamente do gin de cereja: quando o servimos, ele vai acompanhado de uma água tónica neutra, porque como ele já tem um sabor natural, recomendamos a cereja para que seja complementado com algo que reforce esse mesmo sabor.
Além do gin e do licor, existem mais produtos baseados em ingredientes da região?
Temos, como já referi, o licor Serrano e temos também o Zimbromel, uma espécie de aguardente de zimbro, conseguida através de um processo de maceração do zimbro em aguardente de cereais, entre outros que têm sido um autêntico cartão de visita da Serra da Estrela.
E a empresa, que foi crescendo, com quantos trabalhadores conta?
Ora bem, a empresa foi crescendo ao longo destes anos e, neste momento, somos 15 trabalhadores.
E quanto fatura?
Estamos a falar de um grupo de duas empresas. De um lado, temos a empresa original, que era em nome pessoal e que se mantém e, do outro, a outra empresa que tive de constituir – Licor Serrano Lda – essencialmente para produção, enquanto a primeira é uma empresa de distribuição. O grupo fatura, com impostos, à volta de 2 milhões e 800 mil euros.
Quando começou o público-alvo eram as pessoas da região, mas de certeza que hoje já tem uma clientela mais vasta. Quem consome estes produtos?
Estes produtos direcionam-se para dois mercados: o do consumidor final e o do retalhista. Nesses, alguns dirigem-se para uma faixa etária específica. O gin, por exemplo, vai dos 19 anos aos 50, que é a faixa etária que o consume mais. Diria, mais especificamente, dos 25 aos 50 anos, porque é uma faixa com mais poder económico, maior autonomia financeira e capacidade para consumir estes gins premium. Depois, temos aquelas bebidas mais direcionadas para jovens entre os 18, 19 ou 20 anos, como por exemplo o Savanas ou o Bali Beach. Temos ainda outro segmento, mais ligado para o mercado tradicional.
E falando em exportação, qual é o peso desta para a faturação?
Neste momento, não é muito elevado. Ronda os 15%. Não que seja mau, mas temos grandes perspetivas de futuro. Ainda hoje, por exemplo, recebemos uma encomenda do Luxemburgo e temos também uma encomenda para a França. Já exportámos para o Canadá, Brasil e estamos agora na Colômbia, em negociações.
As pessoas aqui da região não estavam habituadas a fazer gin, por exemplo. Quando teve essa ideia onde foi buscar o know how, os destiladores e os técnicos?
Às vezes, temos à nossa beira as coisas e quase não as vemos. Nós fazemos a destilação pelo processo tradicional, tão simples quanto isso. É um alambique tradicional como no tempo dos nossos pais e avós. Óbvio que houve melhorias a nível de controlo de temperatura e controlo de qualidade, fruto de alguma investigação e trabalho que fizemos, de modo a conseguirmos um produto bastante bom através do alambique tradicional.
Estamos agora com um projeto para desenvolver: um novo alambique que opere por arrasto de vapor. É um processo diferente do alambique tradicional, onde uma caldeira faz a evaporação do álcool numa serpentina que se transforma em destilado de algo: um fruto, uma erva, etc.. No arrasto, o processo é bastante diferente: a caldeira produz vapor a alta pressão, que passa pelos frutos fermentados e arrasta o álcool, evitando o risco de queimar. É um processo muito mais eficaz, com muito mais qualidade e para o qual estamos a avançar a passos seguros.